Alessandra com o companheiro Lucas e a cachorrinha Flow (Foto: Priscila Jamma)

Cada mulher tem a sua história e com a maternidade não poderia ser diferente. No caso da atriz, roteirista e diretora Alessandra Colasanti, a gestação aconteceu naturalmente aos 45 anos. Ela está a espera de um menino, que deve vir ao mundo no fim de maio. Em entrevista exclusiva para o Mãe aos 40, Alessandra contou como está lidando com esse momento da vida e o que espera para o futuro.

Com uma sensibilidade ímpar, a atriz fez questão de deixar claro que respeita e se solidariza demais com tantas mulheres que estão em busca de um positivo após os 40 anos. “Minha gestação foi natural, sem nem contar o período fértil, nunca perdi um bebê, a gestação está correndo perfeitamente bem… No entanto, essa é a minha história. Mas eu sei que têm mulheres que perderam bebês, que estão em processo de fertilização, que tentam há anos e carregam dores profundas por isso. E quero deixar claro o meu respeito e solidariedade a todas elas. Deixar claro que não quero, de forma alguma, usar minha história como paradigma de nada. Cada uma tem a sua história e, como é muito individual, acredito que isso faz parte da missão de vida de cada mulher. Me identifico com todas vocês e não quero ser leviana dizendo que a gravidez é sempre um mar de rosas. Sintam todas vocês o meu carinho”, ressaltou.

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Foto: Priscila Jammal

Veja a seguir a entrevista na íntegra:

Mãe aos 40 – Como era a questão da maternidade para você?

Alessandra Colasanti – Sempre tive muitas dúvidas. Meio dúvida, meio medo. Medo de virar mãe e perder minha identidade, medo de me sentir presa, dúvida se estaria pronta, se teria coragem… e nessa espera por uma certeza absoluta, uma idealização que nunca chegava, o tempo foi passando. No meu primeiro casamento cogitava ser mãe, mas tinha 20 e poucos anos e optei pela carreira. A maternidade pra mim nunca foi uma prioridade, parecia um projeto distante.

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Mãe aos 40 – Muitas mulheres começam a realmente cogitar serem mães quando completam 40 anos. Com você também foi assim?

Alessandra Colasanti – Sim. Com a chegada dos 40 essa relação mudou. E o medo de não ser mãe se tornou maior do que o medo de ser mãe. Mas as dúvidas não desapareceram, especialmente a maior delas, a “irrespondível”: esse desejo vem de mim, ou da sociedade? É uma vontade minha legítima? Ou um condicionamento social? Sou eu? É a biologia? A cultura? Instinto? Um chip? Mesmo hoje, radiante por estar grávida, não ouso responder a essa pergunta. Por outro lado, acredito muito no mistério, no imponderável, naquilo que nos transcende; no aspecto espiritual da maternidade e da paternidade. Nada acontece por acaso. Encaro a maternidade como uma parte importante da minha missão de vida, do meu desenvolvimento espiritual, da minha relação com o dar e receber amor. Por isso, acho mesmo que não são todas as pessoas que precisam passar por isso. Cada um tem sua história, desafios e acordos. Eu levei muitos anos pra chegar no meu momento, o momento em que estou profundamente disponível para essa experiência. E não estou falando de disponibilidade de tempo, nem de dinheiro, estou falando de coração, de emoção. Então esse é o meu momento, o momento certo. Por isso não acho justo denominar a minha gestação de “gestação tardia”, nem a minha e nem a de nenhuma outra mulher. Tardia em relação a quê? Não tem sentimento de falta, pelo contrário, é um momento de completude. Com a chegada dos 40 bateu sim vontade, mas eu estava solteira e nunca quis ser mãe solo. Bateu a vontade mas tinha que ser ao lado de um companheiro. E essa pessoa não existia. Então eu, como tantas mulheres, passei a viver a vertigem da ampulheta, com medo do tempo se acabar. Tentava não pensar nisso, entregar e confiar.

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Foto: Reprodução Instagram

Mãe aos 40 – A tendência é que com o passar dos anos, especialmente após os 35, os médicos encaminhem as mulheres que desejam engravidar a especialistas em reprodução assistida. Você passou por isso?

Alessandra Colasanti – Anos atrás fui numa ginecologista que me disse, sem eu nem perguntar, que encaminhava todas as pacientes dela a partir dos 35 para um profissional em reprodução humana. Falta espaço para subjetividade de cada indivíduo, de cada história nessa abordagem dela e de tantos outros profissionais. O corpo humano não é um relógio, nem uma fábrica. A vida não é uma lista de afazeres a serem ticados. Como médica ela é uma autoridade e as mulheres se sentem desarmadas, desarvoradas diante dessa questão. O que um médico fala tem muito valor na nossa cultura. As pessoas não se conectam com a sua intuição. Acredito que exista uma indústria, que certamente ajuda muito quem precisa, mas também explora e ganha muito dinheiro às custas das inseguranças das mulheres. Que nem são propriamente delas, vamos combinar? A exigência social em relação à maternidade é do nível do tabu. É muito complexo, muito duro pra uma mulher assumir que não quer ser mãe. Nunca mais voltei nessa ginecologista.

Anos depois, acuada, procurei uma médica especializada em reprodução humana pra realizar o congelamento. Muitas, mas muitas amigas minhas já congelaram, ou estão pensando em congelar. É um saída “confortável” porque é uma forma de congelar suas dúvidas, de adiar decisões, de não se sentir em dívida com a expectativa social. As mulheres estão pagando pra ganhar tempo, mas o estresse íntimo não cessa. É uma falsa panaceia. Logo na minha primeira consulta, desisti. As chances de uma reprodução assistida já giram normalmente em torno dos 20%, se você colhe seus óvulos depois dos 40 esse percentual pode cair para 10% e até 5% , achei que era tudo muito artificial. Não gostei da ideia de me encher de hormônios, de ficarem me cutucando, me espetando, me monitorando e depois ainda ter que passar por todo o processo da fertilização in vitro, desgastante física e emocionalmente. Naquele momento eu tive certeza de que por esse périplo eu não estava disposta a passar. Se fosse pra acontecer, contrariando a lógica corrente, teria que ser pelas vias naturais mesmo.

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Mãe aos 40 – Acha que não ter pensando tanto em engravidar acabou favorecendo que a gravidez acontecesse, afinal, a ansiedade e pressão só dificultam ainda mais as chances?

Alessandra Colasanti – Os relatos de como a ansiedade interfere negativamente nos processos das tentantes são inúmeros. Eu imagino o quão cruel seja pra quem está tentando e quer muito, ouvir que você precisa relaxar! Deve ser muito estressante ! Mas as histórias estão aí. Essa é uma mecânica do universo, referente a todos os campos da vida, é preciso entregar. As coisas precisam fluir, como as águas. Há pouco mais de 3 anos começou meu relacionamento com o Lucas, meu atual marido e pai do meu bebê. Mas a nossa diferença de idade é muito grande, então eu não entrei nessa relação achando que a gente ia casar e ter filhos. Eu simplesmente estava gostando de estar com ele. Se eu pensasse em termos de projeto não fazia sentido nenhum, mas eu não ia abrir mão de uma pessoa que estava me fazendo feliz, pra deixar a porta aberta para um homem imaginário. O Lucas é real, não uma projeção. E por incrível que pareça, o tema filhos logo apareceu. Paramos de nos prevenir contra a gravidez. Cheios de inseguranças e incertezas, mas paramos. O Lucas hoje está com 23 anos.

Jogamos pro universo e ele disse “sim”. Vejo esse sim, em termos simbólicos, como um sinal verde para a nossa relação, para o nosso encontro. Esse filho não é um projeto meu, é um projeto nosso. A relação com o Lucas é muito leve, alegre e ao mesmo tempo absolutamente profunda. Não seguimos a lógica da superfície das coisas, simplesmente deixamos o fluxo dos nossos corações nos conduzir. Não é tão automático quanto possa parecer, demanda trabalho, abertura e confronto com nossos próprios preconceitos. Mas por aqui tem funcionado! E estamos muito felizes! Nunca quis ter um bebê a qualquer custo, nem com qualquer um. Essa é a nossa história.

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Mãe aos 40 – Riscos. Essa é a palavra que parece estar grudada na maternidade aos 40 anos ou mais. Você acha que isso é desestimulante para quem está tentando?

Alessandra Colasanti – É um horror isso. Mais que um horror, um estigma. Na minha opinião essa narrativa corrobora a lógica patriarcal de opressão e subjugação do corpo da mulher. A cultura exige que mulheres sejam mães, mas que sejam mães jovens, que negócio é esse de ter outros interesses? A mulher que se permite ter filhos “mais tarde” é uma ameaça à essa dinâmica de controle. Uma forma de coagir as mulheres é sobrecarregar de fantasmas a chamada gestação tardia. Não estou dizendo que os números da medicina que acusam maior probabilidade de riscos gestacionais entre mulheres mais velhas ou bebês com disfunções genéticas não sejam reais, mas a forma de contar uma história muda completamente a apreensão dessa história. Eu sou roteirista e sei disso. Portanto acho que há uma distorção aí, um terrorismo médico que alimenta a culpa e o medo entre as mulheres. Muitas desistem, não se sentem no direito. Assim que me vi grávida, escolhi não ler essas coisas, se um conteúdo começa falando de riscos eu já descarto. As pessoas, até mesmo “autoridades no assunto”, repetem informações de forma irrefletida, automática. Busquem saber, existem mais coisas entre o céu e a terra do que supõe nossa vã pesquisa do Google de cada dia.

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Mãe aos 40 – Como está sendo sua gestação?

Alessandra Colasanti – Tudo maravilhoso. Não tive enjoos, nem vômitos, tive um leve cansaço no início, igual a todo mundo, mas depois passou. Pressão ok, glicemia ok, todos os exames ok, placenta ok, bebê ok. Sem inchaços, sem espinhas, sem azia, sem estrias, sem prisão de ventre e sem ganho acentuado de peso. Sempre morri de medo de perder o controle do meu corpo, mas isso não aconteceu. Nem desejos eu tive rs. Tudo leve. Estou no oitavo mês de gestação. Estou me divertindo com as transformações do meu corpo, adorando a barriga, os seios, o arredondar-se, o alargar-se, a espera. O Lucas me agarra o dia inteiro. É um misto de fofura com vertigem. Tô achando esse estado entre mundos muito curioso. Estou até escrevendo um texto sobre isso. É um estado de suspensão.

E no campo emocional é um trabalho incessante, que começa não na hora que o teste dá positivo, mas antes, muito antes. Quando descobri que estava grávida foi um turbilhão, uma avalanche de afetos, são véus que se levantam, tampas que se abrem, conteúdos profundos que se revelam. Tenho trabalhado muito internamente, inclusive a relação com a minha mãe, que também tem participado desse processo. Acredito que a relação com a própria mãe seja uma das primeiras coisas que as mulheres são convidadas a revisitar nessa fase. Afinal, estamos a caminho de tornarmo-nos mães. Tem uma passada de bastão necessária aí. É tudo muito intenso, e é muito lindo ao mesmo tempo. Pra mim esse filho é um processo de amadurecimento, de cura , de ir além de si.

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Foto: Priscila Jammal

Mãe aos 40 – Você já sabe o sexo do bebê ou tem nome pra ele ? Ou vai ser surpresa?

Alessandra Colsanti – Nunca cogitei não saber o sexo. Não é uma questão. Tenho amigas que não quiseram saber. Eu quis. É um menino. Nome… rs tá mais difícil, temos uma listinha, mas ainda não batemos o martelo.

Mãe aos 40 – O que você diria para as mulheres que estão na faixa dos 40 anos e querem ser mães?

Alessandra Colasanti – Nossa… talvez essa seja a pergunta mais difícil até aqui… não sei se me sinto apta a dar conselhos, porque cada história é uma história, eu não sou modelo de nada, sou apenas uma narrativa possível entre infinitas possibilidades. Acho que a minha maior contribuição é partilhar a minha história. Mas baseada na minha experiência, arriscaria dizer que tenho encarado a maternidade como um grande convite à conexão. Conexão com o filho, conexão com o marido, conexão com a mãe, conexão com outras mulheres, conexão com a natureza e sobretudo, conexão com nós mesmas, com nosso corpo e com a nossa jornada, é algo imenso. Amo uma frase do mestre Rumi que diz, caminha e o caminho se abrirá. Gostaria de vê-las caminhando em direção aos seus sonhos.

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Foto: Priscila Jammal

Mãe aos 40 – A maternidade é um capítulo totalmente avassalador e transformador na vida de uma mulher. Como você está lidando com isso?

Alessandra Colasanti – Estou me virando rs. Sinto que estou subindo a ladeira de uma montanha russa. Nessa subida lenta estou fazendo terapia, constelação familiar, lendo livros, assistindo vídeos… Esse momento é também uma despedida da antiga Alessandra, então quando posso me permito não fazer nada e só aproveitar ser “essa eu” que irá desaparecer em breve. Estar com mulheres, ouvir as amigas, outras mães também tem sido rico.

Mãe aos 40 – Como está a expectativa e os preparativos?

Alessandra Colasanti – A reforma do quarto, enxoval, chá de bebê, escolher nome, todos os médicos, exames, tudo o que é preciso (e não é preciso) comprar! É de enlouquecer. Com o Corona Vírus tudo isso ficou mais caótico ainda. Mas penso que todas essas coisas do mundo prático, funcionam como um chamamento. É através desse monte de função que o universo da maternidade vai se instalando. Tem uma dimensão simbólica. Em inglês tem a expressão “nesting”, que é aprontar o ninho, acho que passa por aí. A expectativa é indizível, não tem como dimensionar.

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Mãe aso 40 – Você tem lido sobre parto, amamentação? como lida com essas informações?

Alessandra Colasanti – Sim. Assisto vídeos e relatos de parto no Youtube, vi os documentários da série “O Renascimento do Parto”, li o livro “A Maternidade e o Encontro com a Própria Sombra”, da Laura Gutman, estou lendo um livro do Michel Odent, já vi um milhão de vídeos de tour pelo quartinho, de mala de maternidade, do que não comprar para o enxoval, qual o melhor berço, melhor carrinho, melhor babá eletrônica…essas coisas. Mas não fiz nenhum curso. Escolhi uma equipe de parto humanizado e minha intenção é realizar um parto natural. Eu sempre tive pânico de parto, mas tô animada pra viver esse momento ritualístico da vida da mulher. A amamentação é sempre apresentada como um grande problema, assim como o puerpério, tudo é pintado como muito complexo, muito custoso, muito extenuante, acho que estou tão saturada desse estado de alerta geral, risos, que sei lá, na minha inocência me iludo que estou “preparada” pro pior, quando o bebê chegar torço pra me impressionar com as coisas boas, arrebatadoras. O centro da vida é o amor e quero crer que estou me encaminhando para esse lugar.

Mãe aos 40 – Você mencionou o Corona Vírus, conta como está a sua rotina, as inseguranças, o que mudou?

Alessandra Colasanti – Cancelamos o chá de fraldas, os móveis do quartinho não sei se chegarão a tempo. Estamos internados em casa, eu, o Lucas, o bebê dentro da barriga e a nossa cachorrinha Flow. Estamos vivendo um pré pós parto. Tirando toda a tragédia, está sendo bom pra gente, essa interiorização. A casa, a gestação, a nossa relação e a intimidade ocupam o centro das nossas vidas nesse momento. As inseguranças que o vírus trás são muitas, mas tento me alimentar da potência que é estar gerando uma vida. Até esse momento fomos informados que ninguém entra na maternidade, nem nossos pais, e visitas em casa também não estarão permitidas. É tudo muito impactante. Mas como o bebê está previsto para o final de maio, tento não antecipar emoções. Não sabemos como estará a situação até lá. Estamos cheios de vida e good vibes no nosso cantinho.

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