Patrícia engravidou quando achava não ter mais esperanças (Foto: Arquivo pessoal)

“Minha história transita entre momentos de extrema tristeza, perseverança e autoconhecimento em torno da maternidade. Apesar de sempre ter sido uma pessoa saudável – os únicos problemas que lembro de ter tido foram uma candidíase crônica durante a adolescência e cistite – meu corpo deu muitos sinais que eu não poderia ser mãe.

O ano é 2014. Engravidei no mesmo mês que minha avó materna faleceu. Como tínhamos uma ligação muito forte, recebi a notícia da gravidez como um presente de Deus, justamente por ter perdido alguém muito especial para mim. Seis semanas depois da descoberta, comecei a ter corrimento e cólicas. Fui até o hospital e o plantonista me falou que era cólica intestinal! Saí de lá louca da vida e liguei para meu médico, que me aconselhou aguardar a evolução. As cólicas aumentaram, a ponto de eu me retorcer de dor. Não demorou muito para o tão temido sangramento aparecer, seguido por um aborto espontâneo.

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É hora de investigar!

Um ano passou e veio a descoberta de uma nova gravidez. Foi uma alegria sem tamanho! Aquela luz da esperança acendeu novamente em mim. Porém, a alegria durou pouco: com apenas cinco semanas, mais um aborto espontâneo. Fiz um exame de sangue e descobri que dessa vez a causa era a listeriose (uma infecção bacteriana provocada pela Listeria monocytogenes). No final do mesmo ano, em 2015, veio uma nova gestação. E apesar da esperança que dessa vez seria diferente, era impossível não ter medo e incertezas. Não deu outra: outro aborto nas primeiras semanas! E a explicação que os médicos me davam era que provavelmente havia má formação do feto, impedindo-o de continuar evoluindo.

Só que eu comecei a desconfiar desse diagnóstico. E resolvi começar a investigar e realizar um possível tratamento. E foi o que fiz: em 2016, fui juntamente com meu marido atrás de uma geneticista. Ela pediu vários exames, alguns deles bem demorados. Passamos quase o ano inteiro investigação, e nesse período engravidei mais duas vezes, perdendo o bebê nas primeiras semanas. Todas as vezes eu expelia o feto por completo, não precisando fazer a curetagem. E isso começou a me deixar encucada, tinha a impressão e horrível sensação que meu corpo rejeitava a gravidez de tal maneira que nada parava lá dentro.

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O bebê de Patrícia estava do tamanho de uma maçã quando ela tirou essa foto (Arquivo Pessoal)

“Comecei a odiar o fato de ser mulher”

Comecei a me sentir péssima e a odiar o fato de ser mulher. Passei a me questionar o motivo de eu ter que atravessar tudo aquilo. Por que logo comigo, logo eu que queria tanto ter vários filhos? Os resultados dos exames genéticos iam saindo e nenhuma evidência aparecia para apontar o possível problema. Enquanto isso, eu ficava cada vez mais frustrada. Cheguei a pensar que aquilo já era demais para mim, que não suportaria tamanha dor.

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“Pensei que poderia acabar com o sofrimento dando fim à minha vida”

Conversando com meu marido, decidimos partir para uma inseminação artificial, que me encheu novamente de esperanças. Porém, antes de fazer o procedimento, precisei passar por um exame doloroso demais. A histerossalpingografia [um raio-x do útero e das trompas uterinas, usando contraste de iodo, que injetado no interior do útero através de uma cânula], serve para diagnosticar malformações, doenças do interior do útero e das trompas. Quase morri de tanta dor ao fazer esse exame sem anestesia. Por isso, quando soube que precisaria repeti-lo, não hesitei em querer com anestesia. Só que nem assim achávamos um motivo para tantos abortos espontâneos. Sem saber a causa, a frustração bateu forte.

O sofrimento que essa situação toda me causou foi tão grande que duas ou três vezes pensei que poderia acabar com o sofrimento dando fim à minha vida. Cheguei a pensar que todas as minhas escolhas até aquele momento haviam sido erradas, que eu não fazia nada certo. Comecei a me sentir um lixo, cheguei ao fundo do poço. Mas ao pensar melhor, passei a entender que não era culpa minha. Não havia escolha errada. Eu estava casada com o homem da minha vida, com a minha alma gêmea, com uma pessoa tão, mas tão especial que não media esforços para me dar todo o apoio do mundo. Ele, alguns familiares, amigos e meus cachorros foram fundamentais nesse processo.

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Patrícia engravidou quando achava não ter mais esperanças (Foto: Arquivo pessoal)

“Para tirar o foco da dor, me matriculei nas aulas de teatro. Foi a melhor coisa que fiz!”

Até então eu não havia procurado por ajuda e terapia. Mas resolvi tirar o foco da dor e realizei um sonho de infância: me matriculei nas aulas de teatro! Foi a melhor coisa que eu poderia ter feito: voltei a me amar e me cuidar, voltei a respirar com todo meu potencial. Empoderamento feminino que fala, né!? Rs.

Nesse mesmo período saiu o resultado de um exame, cuja sigla é MTHFRS [Metilenotetrahidrofolato redutase é uma enzima que existe nas células e participam do metabolismo e redução dos níveis de aminoácidos no sangue], e lá apareceu uma mutação no heterozigoto. Pensei comigo: “descobrimos o problema, agora vai.” De uma hora para outra, o diagnóstico da mutação fez todo sentido e as coisas começaram a se encaixar. Minha irmã teve trombose na perna logo após o nascimento da primeira filha, e meu pai havia saído do hospital recentemente com trombose nas duas pernas.

Descobri que deveria tomar anticoagulante durante a gravidez toda e após o nascimento do bebê. Até então eu sequer soube disso. Em 2017 engravidei novamente de forma natural. Comecei a tomar o anticoagulante já no início da gestação e estava tudo correndo bem, até chegar o dia de fazer a ecografia de translucência nucal. Durante a eco, o médico encontrou vários problemas: não visualizou o osso nasal, notou uma alteração na inserção no umbigo… E veio o diagnóstico da Síndrome de Edwards [doença que provoca atrasos graves no desenvolvimento, devido a um cromossomo 18 extra]. Foi uma baque! O médico falou que havia a opção de fazer um exame, realizado com a introdução de uma injeção na barriga, mas que correria o risco de perder o bebê por conta dessa invasão. A outra opção era aguardar. Foi o que fiz. Enquanto isso, eu e meu marido fizemos uma viagem, a nossa segunda lua de mel – mais que merecida – e quando voltamos, fizemos outro eco e não havia mais batimentos cardíacos. Quase morremos de tristeza, a gente só se abraçava e chorava. Dessa vez tive que ir ao hospital. Me deram um remédio para ter contrações e expelir o feto. Foi horrível. Não desejo para ninguém! O bebê já estava formadinho. Com toda certeza foi o momento mais chocante e difícil da minha vida.

Patrícia engravidou quando achava não ter mais esperanças (Foto: Arquivo pessoal)

A adoção, autoconhecimento e uma grata surpresa!

Daquele momento em diante, falei para o meu marido que não queria mais passar por tanta dor. E concordamos em entrar para a fila da adoção já no mês seguinte à última perda. Levamos o ano inteiro para juntar todos os documentos necessários, participando de entrevistas e palestras.

Nesse meio tempo, comecei a estudar terapias alternativas. Fiz curso de Reiki, aulas de ioga e meditação, participei de retiros e fiz um curso de aromaterapia. Também comecei a fazer terapia, já que é necessário um lado psiquiátrico que prove que você está apto a adotar uma criança. O laudo saiu e eu continuei na terapia, pois estava me sentindo melhor com ela.

Em fevereiro desse ano, viajei novamente com meu marido e, para nossa alegria, ao voltar, recebemos a notícia que estávamos habilitados para adoção. Foi uma alegria muito grande, comemoramos muito e, a partir daquele momento, eu olhava para ele e dizia: “estamos grávidos”. Seríamos, enfim, pais!

Já decidida a adotar, voltei ao ginecologista apenas para ver o que podia fazer para acabar com as indesejáveis cólicas e dores de cabeça causadas pela TPM. Como minha menstruação estava irregular, ele sugeriu colocar o DIU. Mas não gostei da ideia. Comprei uma cartela de anticoncepcional, mas como o ciclo estava irregular, esqueci a cartela na gaveta. E para a nossa surpresa, um dia resolvi fazer o teste de gravidez e deu positivo! No mesmo dia já comecei a aplicar as injeções de anticoagulante que já tinha em casa. E dessa vez a gestação evoluiu! Estamos passando pelo momento mais feliz e desejado de toda nossa vida. Os exames estão perfeitos. Estou grávida de 28 semanas e é um menino, que vai se chamar Henrique.

As expectativas para o futuro são as melhores possíveis: estamos fazendo o quartinho, eu já estou pensando no chá-de-bebê… Sinto ele mexer todo dia. É uma sensação maravilhosa e ao mesmo tempo muito louca, mas estou amando. Choro em todos os exames que ouço o coração dele. Sei que ele será muito amado por todos. E sei também que tenho sete filhos, apesar de seis deles não estarem entre nós. Todos estão em meu coração, pensamento e orações, e são também muito amados!

Tudo o que passei para chegar até aqui fez com que eu amadurecesse e voltasse à minha essência. Passei a ser grata, inclusive pelos momentos difíceis. Eu precisei mudar para que aquela história ruim parasse de se repetir. E descobri o quanto sou forte! Continuo com planos de ter uma casa cheia de crianças. Não mais seis filhos. No  máximo três. E quero que os amigos deles venham brincar em casa também. Quero a minha casa com alegria, barulho e bagunça!”

Depoimento de Patrícia Fernandes Luis, 41, designer de interiores, terapeuta e empresária, de Quatro Barras (PR).

Patrícia engravidou quando achava não ter mais esperanças (Foto: Arquivo pessoal)