Se você passou dos 35 anos e está grávida ou tentando engravidar, é provável que já ouviu dizer, até mesmo da boca do seu médico, que a “gestação tardia” é uma indicação de cesárea, afinal, o corpo já não é tão jovem para “aguentar” o parto normal/natural. No entanto, a idade NÃO é indicação de cesárea! “Assim como circular de cordão, falta de dilatação, muito ou pouco líquido, bolsa rota, bebê grande ou pequeno demais, trânsito nas grandes capitais, bebê com unha muito comprida, mãe magra ou gorda além do ideal não são indicações para cesárea. Essas são apenas algumas das centenas de justificativas dadas por profissionais médicos para justificar as cesarianas para mulheres no final da gestação. A cirurgia normalmente acontece em duas situações: ou porque o médico indicou – correta ou incorretamente – ou porque a gestante quis. Só nos resta saber se ela foi informada dos riscos acerca de tudo que diz respeito ao procedimento. Muitas vezes, sem apoio e informação, a grande maioria das mulheres é encaminhada ao centro cirúrgico, fazendo do Brasil um país recordista de cirurgias. E o mais grave: a esmagadora maioria delas é eletiva, sem trabalho de parto”, diz a ginecologista e obstetra Anna Beatriz Herief.
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A médica faz questão de reforçar que é importante que a mulher saiba que a cirurgia cesariana só é indicada de maneira absoluta em algumas situações bem específicas (e pouco comuns) e muitas delas só serão decididas após o trabalho de parto já ter iniciado.
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Veja abaixo as 10 indicações absolutas de cesárea, explicadas por Anna Beatriz:
1. Placenta prévia total
Nesse caso, a placenta recobre totalmente o colo do útero e se interpõe entre a cabeça (ou bumbum) do bebê e o colo do útero, contraindicando o parto normal pelo imenso risco de descolamento de placenta, hemorragia materna e consequente óbito fetal.
O diagnóstico definitivo só é possível no terceiro trimestre, a partir de 28 semanas.
Dessa maneira, está indicada a cesariana eletiva com até 38 semanas de gestação ou o mais rápido possível caso o trabalho de parto se inicie espontaneamente antes dessa data.
Observação: Placentas de inserção baixa ou marginal são compatíveis com o parto normal, monitorando-se o sangramento materno.
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2. Bebê em situação transversa
O bebê transverso é aquele que não se encontra cefálico (de cabeça pra baixo) nem pélvico (sentado), ou seja, está atravessado dentro do útero e, ao toque vaginal, palpam-se partes fetais como ombro, cotovelo ou mão do bebê.
Acontece em menos de 1% das situações.
É importante ressaltar que a maioria dos bebês transversos no final da gestação assumirá a apresentação cefálica ou pélvica quando do início das contrações. Sendo assim, só está indicada a cesariana se confirmada a situação transversa durante o trabalho de parto ativo.
Ainda, deve-se apresentar à gestante a opção da Versão Cefálica Externa (VCE), uma manobra realizada pelo obstetra com a finalidade de virar o bebê para cefálico, entre 36 e 38 semanas, viabilizando assim, o parto normal.
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Produção dos hormônios femininos
A especialista conta que a ação da melatonina a favor da fertilidade não para por aí. Ela também atua na produção dos hormônios sexuais femininos, que por sua vez, precisam ser produzidos em níveis adequados e atuar em sinergia para que a gestação aconteça. “A melatonina age nas células da téca e da granulosa, que são camadas celulares dos óvulos, e colabora para o aumento da expressão de receptores do hormônio LH e FSH e da atividade da aromatase, uma enzima que converte androgênios em estradiol e atua ainda na produção de progesterona, favorecendo a ovulação e possível gravidez”, diz.
3. Lesão de herpes genital ativa
Em caso de herpes genital com lesão ativa no início do trabalho de parto, também está indicada a cesariana, pela maioria dos consensos. No entanto, algumas diretrizes admitem a possibilidade do parto normal se não for primo-infecção, ou seja, se não for a primeira vez em que a doença se manifesta.
É possível, também, em caso de lesões recorrentes de herpes genital na gestação, profilaxia com medicação antiviral antiherpética partir de 36 semanas, a fim de se evitar recorrência de lesão no momento do parto e possível contraindicação ao mesmo. Se for no final da gestação e ainda houver tempo da lesão cicatrizar em alguns dias, não há necessidade de agendar uma cesárea – basta aguardar o início do trabalho de parto normalmente, após tratamento adequado e profilaxia mantida.
Vale também lembrar que herpes é diferente de HPV e lesões condilomatosas (verrugas vulvares/perineais) e essas NÃO indicam cesariana, a não ser que sejam grandes o suficiente para obstruir o canal de parto (o que é bem raro).
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4. Desproporção cefalopélvica (DCP)
O diagnóstico de desproporção entre a cabeça fetal e a pelve da mãe só é possível durante as fases finais do trabalho de parto, em vigência de contrações regulares, ritmadas, frequentes e efetivas, sem progresso por várias horas, a despeito das tentativas frustradas de se estimularem posturas e exercícios específicos para a insinuação da cabeça pela pelve.
Vale ressaltar que não necessariamente a DCP acontece devido a cabeças maiores de bebês grandes (macrossômicos). Pelo contrário, em sua grande maioria, acontecem por maus posicionamentos de cabeça (assinclitismos ou deflexões). Ou seja, não significa que em uma próxima gestação essa mulher não possa ter parto normal.
Não existe nenhum método capaz de predizer esse diagnóstico antes da fase ativa do trabalho de parto, seja ele pelvimetria, simples toque vaginal, medida do perímetro cefálico, tamanho do pé, raio x, etc. Trata-se inclusive de uma das maiores indicações falsas de cesariana, fora do trabalho de parto ou no início dele. Não caiam.
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5. Frequência cardíaca fetal não-tranquilizadora
Antigamente, chamávamos essa ocorrência de sofrimento fetal agudo. De acordo com a OMS, durante o trabalho de parto, a ausculta fetal deve ser realizada de maneira intermitente, dado que a monitorização contínua não mostrou maiores benefícios (não protegeu a mais bebês). Nas gestações de risco habitual, deve-se auscultar de 30 em 30 minutos e, nas gestações de alto risco, a cada 15 minutos na fase ativa. Já no período expulsivo, esse tempo cai e deve ser entre 5-15 minutos.
Padrões anormais de ausculta podem vir a demandar a realização de cardiotocografia (CTG) intraparto. Se o resultado for desafavorável, podem ser indicadas medidas de ressuscitação intra útero e cesariana, caso persistente. Em caso de bradicardia mantida por 10-15 minutos, a despeito das manobras de ressuscitação, já está indicada a abreviação do parto (sem necessidade de CTG). Se isso acontecer durante o período expulsivo, a antecipação do parto deverá ser realizada pela via mais rápida de nascimento, não raro através de parto instrumental (vácuo extrator ou fórceps).
Em caso de falha do parto instrumental ou se fora de período expulsivo, estará indicada a cesariana imediata (emergência).
6. Parada de progressão
Diz-se quando o trabalho de parto, já bem avançado, estaciona em determinado ponto, sem quaisquer progressões, seja de descida ou rotação da apresentação (cabeça ou bumbum), seja de dilatação (ou ambos), na vigência de contrações efetivas de trabalho de parto. Mais recentemente, tanto vários autores quanto diretrizes concordam que os parâmetros devem ser mais elásticos e condescendentes e que se devem individualizar condutas, já que cada mulher e cada parto são únicos e existe grande variação na evolução do trabalho de parto (a tal da individualidade né?).
Na assistência 1:1, com vigilância fetal adequada e vitalidade fetal preservada, não se deve haver limite de tempo de espera. Ainda, devem-se considerar, antes de se indicar cesariana, correção do padrão de contração e amniotomia (ainda que sem efetividade comprovada quando comparada à conduta expectante), além de exercícios e posturas que possam favorecer correção de maus posicionamentos de cabeça fetal.
Individualizar sempre, intervir quase nunca.
7. Prolapso de cordão
Trata-se de uma intercorrência obstétrica bem pouco frequente, de alta mortalidade fetal e que, portanto, demanda pronta intervenção por parte da equipe assistente, caracterizando uma das maiores emergências obstétricas.
O prolapso acontece quando uma alça de cordão se interpõe entre a cabeça do bebê e o canal de parto, podendo ter seu fluxo interrompido em algum momento e levar à asfixia aguda fetal, por compressão. Ocorre com mais frequência quando a bolsa se rompe e a cabeça se encontra muito alta na pelve, favorecendo que o cordão se insinue para frente da cabeça, por vezes chegando a exteriorizar-se pela vagina.
Sua ocorrência espontânea é bem rara e um dos principais fatores de risco é justamente a amniotomia descabida (ruptura artificial da bolsa pelo assistente). Tal procedimento não tem evidência clara de benefício e não deve ser realizado de rotina, dado o risco de prolapso de cordão e também de favorecer maus posicionamentos de cabeça fetal.
Outros fatores de risco: polidramnia, apresentação córmica (bebê atravessado) ou pélvica, CIUR, prematuridade e gemelaridade.
Indica cesariana imediata caso não se encontre em período expulsivo, fase na qual o parto instrumental (vácuo ou fórceps) pode ser mais bem empregado devido à pronta aplicabilidade frente à gravidade do caso. Ainda, até que se extraia o bebê por cesariana, a paciente deve ser deitada de barriga para cima, com a cabeça e os ombros abaixo de seus quadris enquanto um profissional assistente empurra a cabeça do bebê pra cima por toque vaginal, com fins de descompressão de cordão, como manobra heróica.
8. História de cesariana corporal, miomectomia ou rotura uterina
Se a gestante tiver antecedente de cicatriz uterina não segmentar (histerotomia clássica ou em T), normalmente está indicada a cesariana durante o início do trabalho de parto, devido ao risco aumentado de rotura uterina.
Para mulheres que passaram por miomectomia (retirada de miomas) intramural com chance improvável de dano extenso ao miométrio (camada muscular do útero), a prova de trabalho de parto pode acontecer, com vigilância fetal ainda mais rigorosa, já que os dados disponíveis, embora limitados, sugerem que o risco de rotura uterina após miomectomia não é significativamente maior do que em uma prova de trabalho de parto para uma cesariana anterior (VBAC).
Já para casos suspeitos de comprometimento miometrial importante, tais como miomectomias múltiplas ou extensas, miomectomias laparoscópicas ou se a cavidade uterina foi acessada (ou quase), recomenda-se cesariana eletiva entre 36 e 39 semanas, dado o maior risco de rotura uterina intraparto (fonte: UpToDate/ACOG). O risco de rotura uterina gestacional, fora de trabalho de parto, inclusive no segundo trimestre, também existe.
Vale lembrar, que essa indicação é bem diferente de simplesmente existir histórico de cesarianas anteriores, nas quais as cicatrizes uterinas são segmentares e o risco de rotura é bem baixo (<1% se uma ou duas cesarianas), principalmente quando se comparado aos riscos inerentes a cesarianas de repetição.
9. Descolamento de placenta
Ocorre quando a placenta se desprende da parede do útero durante o trabalho de parto ou fora dele, podendo levar à morte fetal por asfixia e à morte materna por hemorragia, caso não haja pronta e adequada intervenção.
É também uma das maiores e mais graves emergências obstétricas e urge interrupção imediata da gestação, pela via mais rápida de nascimento, em geral a cesariana, visando a extrair o bebê ainda com vida ou o menos comprometido possível.
Pode acontecer em decorrência de síndromes hipertensivas (80%), trauma (10-15%), uso de drogas (principalmente cocaína) ou, ainda, não ter causa conhecida/estabelecida. No entanto, há duas exceções: se o feto já estiver morto, quando se deve deixar o parto evoluir normalmente, caso não haja hemorragia grave materna ou se o parto já tiver avançado até o período expulsivo, situação na qual se pode agir mais rápido extraindo o bebê por via baixa através de um parto instrumental (vácuo extrator ou fórceps).
10. Inserção velamentosa do cordão e vasa prévia
Essa é mais uma daquelas indicações de cesariana difíceis e bem pouco comuns na obstetrícia. Inserção velamentosa do cordão e vasa prévia são achados diferentes, mas que podem aparecer em conjunto e levar à recomendação absoluta de cirurgia, eletivamente. Na inserção velamentosa, a parte distal do cordão – aquela que se insere na placenta – pode se dividir em alguns vasos não envoltos pela Geléia de Wharton, ou seja, vasos que não estão adequada e fisiologicamente protegidos, podendo sofrer compressão e aumentando os riscos fetais. A prevalência é de 1% em gestações únicas, sendo mais frequentes em gemelares e em placentas prévias.
Já na vasa prévia, vasos fetais cruzam ou atravessam as membranas que recobrem o orifício interno do colo do útero, o que faz com que, após a rotura da bolsa de águas, aumente o risco de perda sanguínea exacerbada pelo bebê, podendo levar à exsanguinação e óbito.
A prevalecia é de 1:2500 nascimentos, mas bem mais frequente em gestações de reprodução assistida (1:202) e também em gemelares e placenta prévia.
O diagnóstico de inserção velamentosa é dado por características ultrassonográficas, mas não é um diagnóstico simples e tampouco 100% certeiro. Para que se determine a inserção velamentosa, é necessário que o exame tenha sido realizado por um ultrassonografista de confiança, experiente e com aparelhagem de última geração, preferencialmente até USG morfológica (por aqui conto com meu amigo @clinicaburla 🤍). O diagnóstico final é dado apenas ao nascimento.
Caso se suspeite fortemente do diagnóstico, pode-se aventar uma cesariana pelo risco de compressão do cordão, mas é possível sim individualizar o caso e tomar uma decisão compartilhada com o casal, já que não existem evidências de que uma cesariana eletiva traga resultados melhores do que o parto (UpToDate).
Sem outros achados (como vasa prévia) e riscos fetais, a indução pode ser iniciada às 40 semanas, com rigorosa e contínua monitorização fetal, dada a maior frequência de diminuição (fisiológica) de líquido amniótico, podendo aumentar o risco já existente de compressão de cordão.
O diagnóstico de vasa prévia se dá da mesma maneira que o da inserção velamentosa do cordão: a partir de um confiável exame ultrassonográfico. Também é possível o diagnóstico presumido durante o trabalho de parto: sangramento aumentado/hemorragia sem aumento do tônus uterino e com alterações da frequência cardíaca fetal imediatamente após a ruptura da bolsa. Caso haja essa suspeita durante o TP, a indicação é de cesariana de emergência, pois pode tratar-se de uma situação gravíssima.
A vasa prévia pode vir acompanhada ou não de inserção velamentosa do cordão. Caso haja diagnóstico altamente suspeito de vasa prévia (isolada ou em conjunto com a inserção velamentosa) durante a gestação, sugere-se cesariana eletiva entre 34 e 36 semanas (UpToDate).