“Não sei onde doeu e como doeu, eu já esqueci tudo”, conta Adriana Kátia, 43, que passou por um processo de mais de 20 anos de espera, tratamentos, dores, para então realizar seu grande sonho de ser mãe. Em entrevista exclusiva ao “Mãe aos 40”, a professora relatou sua jornada com a infertilidade e como ela e marido não mediram esforços e buscaram alternativas para realizarem o desejo de serem pais.
Vindo de famílias grandes, Adriana e o esposo casaram-se ainda muito novos, ela com 17 e ele com 19. Nos primeiros anos de casados, focaram em validar seus patrimônios e construir uma vida sólida juntos. E quando estavam com pouco mais de 20 anos, decidiram iniciar as tentativas par a aumentar a família.
O que eles não sabiam é que a jornada seria longa e complicada até a concretização deste sonho. Depois de inúmeras tentativas sem sucesso, Adriana começou a se sentir pressionada quando observava que outras mulheres próximas engravidavam e a família ia crescendo ao redor dela.
Adriana sabia que precisava virar aquele jogo. Apenas com o salário do marido e com o que ela ganhava não daria para bancar um tratamento. E foi assim que, impulsionada pelo sonho de ser mãe, ela decidiu entrar na faculdade e batalhar por um emprego melhor, que pudesse pagar um tratamento de reprodução assistida. Adriana se formou e começou a trabalhar na área, porém, neste período a pressão que sentia por não engravidar cresceu e ela sentia-se culpada.
Os primeiros 10 anos de casados chegaram e o casal ainda não havia conseguido engravidar. “Eu sempre pensava: se eu não estou conseguindo, então a culpa é minha. Talvez seja a hora de deixa-lo livre”. E foi assim, sempre se sentido devedora e culpada, que o relacionamento começou a ruir. Vieram as divergências e, apesar de ainda se amarem, pouco antes de completarem 20 anos de casados, eles se divorciaram.
Adriana mudou-se de cidade e, ainda focada em um dia ser mãe, estudou para passar em um concurso público com salário maior. Com muito esforço e empenho, ela tornou-se funcionária pública em duas escolas em cidades diferentes.
Um novo capítulo
Depois de um tempo afastados, Adriana e o marido viram que ainda se amavam muito para deixar aquele amor morrer. Foi aí que voltaram a namorar e, tempos depois, se casaram novamente. De papel passado e tudo mais! “Tudo estava mais leve, pois voltamos sem aquela cobrança louca de ter um filho, que estávamos antes. Porém, esse sonho ainda existia em nós dois”, conta Adriana.
Em concordância, os dois decidiram procurar pelo tratamento que, como haviam visto anteriormente, exigiria muito financeiramente. Sabendo da delicadeza do processo e para evitar expectativas, Adriana decidiu não compartilhar sobre a decisão de iniciar o tratamento para a família.
A jornada com o tratamento
Perto de completar 40 anos, Adriana tinha o recurso financeiro que precisava para o tratamento, porém, agora a idade também passou a pesar como um fator que poderia dificultar o processo. Apesar de saber que o processo não seria fácil, ela sentia-se esperançosa. Na primeira consulta, o médico explicou as dificuldades de uma gravidez após os 40 anos e, apesar do baque com tantas informações, ela manteve a fé. “Para o médico era apenas um número, mas para mim era tudo o que eu precisava ouvir: que eu tinha uma chance”, relatou.
“Aplicava as medicações em mim mesma, na escola, no intervalo entre as aulas”
Entre exames, medicamentos e hormônios, ela foi encarando passo a passo do tratamento. Tomando religiosamente as medicações para estimular os óvulos, Adriana contou ao Mãe aos 40 que levava a medicação para a escola e, nos intervalos entre as aulas, fazia a aplicação correta de cada um. Fora isso, ela ainda se desdobrava entre dar aulas em duas escolas e as idas ao laboratório e clínica para fazer os exames e o acompanhamento necessário.
Dois dias antes da data marcada para a retirada os óvulos, Adriana teve hiperestímulo e sentiu-se mal, com dificuldades de andar. “Eu me arrastava pelos corredores da escola, mas me blindei com a minha fé, acreditei e apostei tudo nesse tratamento”, conta.
Após o procedimento da retirada os óvulos, ainda apreensiva se teria dado certo ou não, Adriana recebeu do médico a notícia que havia 60 óvulos coletados. “O médico até brincou que todos na clínica queriam saber quem era a dona de tantos óvulos”, relembra.
No processo de triagem dos óvulos, 40 foram tidos como maduros. Desses, 20 foram congelados e os outros 20 foram para a etapa de fecundação.
“Finalmente tive coragem de me abrir com a minha mãe”
Passado essa etapa e por conta do hiperestímulo, Adriana precisou ficar de repouso, afastando-se do cargo nas duas escolas. As famílias ainda não sabiam sobre o tratamento, mas ainda em repouso, ela recebeu a visita da mãe e decidiu contar sobre o tratamento, temendo explicar à mãe o quanto era um procedimento caro e desafiador.
O que ela não esperava é que, ao contar à mãe, receberia muito mais que uma resposta positiva. “Minha mãe tem seis filhos biológicos e um de coração. Ela olhou para mim e disse: ‘Eu não conseguiria colocar preço em nenhum de vocês. Se você quer, então faça. Vá atrás do seu neném’. Essa era exatamente a bênção que eu precisava”, contou emocionada.
Apesar de todo o preparo financeiro, o casal havia se programado para tentar a implantação uma única vez. Dos 20 óvulos fertilizados, 12 ficaram bem. Depois da implantação e do tempo de espera, veio então o resultado do primeiro beta: negativo.
Adriana contou que tinha certeza que ficaria firme caso desse negativo, mas não conseguiu. “Tudo veio na minha mente, o tempo de espera, o filho que tanto desejei. Será que era para ser mesmo? Nesse momento eu vi a depressão passar perto de mim. Meu marido falava que se eu não quisesse tentar novamente, estava tudo bem, pois era meu corpo e ele iria respeitar o meu processo”, conta.
Tentar outra vez: uma difícil decisão
Com a apoio de uma amiga próxima e do marido, eles decidiram tentar novamente. Entre novos planejamentos financeiros, troca de medicação, ciclo de hormônios, o endométrio que engrossava e afinava, Adriana sentia suas forças sendo consumidas.
O casal fez uma nova tentativa, dessa vez com dois embriões e novamente, o resultado foi negativo. Até que, por indicação médica, eles optaram pela biópsia de embriões. No processo, quatro embriões foram retirados; dois não passaram no teste e dois estavam bem. “Foi a primeira vez que soubemos o sexo do bebê: tínhamos um casal, um menino e uma menina. Eu comecei a chorar e só pensava que era real e que agora estava muito perto”, relata.
No período entre o procedimento e o repouso necessário, a família de Adriana passou por uma tragédia: seu sobrinho, filho de sua irmã, morreu afogado aos 14 anos. A notícia foi avassaladora para todos. Adriana recebeu a notícia no período em que deveria fazer o teste de gravidez, mas pelo luto que estava enfrentando, não fez o teste. Dias mais tarde, foi constatado que, novamente, o resultado era negativo.
Meses depois, Adriana retornou ao consultório, dessa vez para comunicar ao médico que estava desistindo do tratamento. De forma muito compreensiva, o médico a incentivou a não desistir, mas “tirar férias” de seis meses do processo.
Depois de um período, Adriana retomou o tratamento e início novamente todas as fases de medicações. Já na clínica para passar por sua quarta tentativa, o médico noticiou que, dos três embriões retirados, apenas um estava com qualidade para ser transferido. E era um menino. O médico pediu para que ela escolhesse um nome e, prontamente, ela disse Theo, e então ele falou: “Vai recebendo o Theo e pedindo para ele ficar”.
“No percurso da clínica para a nossa casa, meu marido e eu não falávamos nada. No caminho, eu pesquisei pelo nome Theo, pois havia falado sem pensar. E Theo significa ‘deus’ no grego”.
A espera e o milagre
No período de espera pós procedimento, Adriana retornou ao trabalho e aguardava a licença prêmio, que iniciava logo na semana seguinte. No seu último dia antes do trabalho, resolveu comer em uma pastelaria próximo à escola onde lecionava e lá, encontrou com uma senhora que não a conhecia, e recebeu dela as seguintes palavras: “você será mãe de um menino”.
Apesar de estar confiante, Adriana não queria realizar testes de farmácia, porém já havia comprado alguns deles. Durante a noite, ela teve um sonho que confirmava as palavras que aquela senhora tinha dito a ela mais cedo.
Ali mesmo, durante a madrugada, ela decidiu encarar os testes, que deram positivo. “Eu comecei a chorar e só pensava que Deus havia entregue meu filho”. Ao Mãe aos 40, Adriana contou que viver a dor da negativa a fortaleceu.
Ao todo, foram 27 anos de tentativa, sendo dois anos de tratamento. Emocionada, Adriana relata: “Se eu tivesse que fazer tudo de novo, eu faria. Onde doeu, eu já nem lembro mais. Minha própria cabeça me condenava, condenava o meu corpo, pois ele não reagia. Apesar de todos os exames difíceis, doloridos, constrangedores, eu faria tudo de novo só para ver esse sorrisinho do meu filho”.
O milagre, Theo, chegou saudável ao mundo em abril desse ano, após uma gestação linda e tranquila.